Antigamente tinha letra bonita. Caligrafia calma, desenhada, pintada na vontade de estar perto do papel. Até minha assinatura era mais caprichada.
Os diários dos anos que ficaram nos cadernos são documentos que denunciam uma vontade de fazer registro com decência, mesmo quando as notas não eram tão agradáveis.
A máquina de escrever não foi uma sensação pra mim. Fiz o curso obrigatório, aprendi sequência das letras, sabia usar corretivo. Mas, sem habilidade, não gostava. Acho que por conta do barulho, concluía instrumento sério demais para minhas palavras e ideias. As vezes em que datilografei e saquei a folha e reli, lembro bem, não me identificava, simplesmente não conseguia ver que o que estava ali era registro meu. Formas estranhas para o que rondava na minha cabeça.
Nos primeiros anos de pilotagem de computador, jeca, escrevia tudo primeiro no papel e depois digitava. O rascunho era bonitinho, mas abandonei a perda de tempo e tratei da comunicação direto no batuque.
A parafernália não me tirou os papeis. A imensa coleção de cadernos, folhas de cartas, envelopes, cadernetas, bloquinhos, canetas, lápis coloridos continuou a ser comprada e usada, mas de forma mais escassa. E acho que foi por aí que meu risco foi ficando preguiçoso.
Tenho o grande prazer de me corresponder dentro dos padrões de outros tempos com algumas pessoas. (Só com meu pai que não, com ele as cartas são sempre digitadas, impressas e assinadas – ele prefere assim.)
Sempre que escrevo para os amigos, tomo cuidado para ser clara nas notícias e não desagradável na letra: pior coisa ter que espremer os olhos, virar o papel, analisar o contexto para decodificar palavra.
Mas reparo que a cada dia o esmero exige esforço maior. Preciso escrever mais devagar para que a arte se cumpra e comunique com alguma elegância, que se não de conteúdo, pelo menos de aparência.
Ontem tinha fome de mandar carta: papel, envelope, correio. Assuntos se multiplicavam e eu a escrever na velocidade do pensamento. Não me importei com o rascunho; mas quando fui fazer o serviço definitivo, não mudou muito. Desisti. Me transferi para o teclado e mandei logo de uma vez o que me fervia por dentro.
Fiquei triste porque a ansiedade tem deixado o traço mal feito.
Escrever no papel era igual namorar devagarinho: escorregar pelo corpo, tatear linhas, sentir na ponta dos dedos, pedaço por pedaço…
Acho que perdi o jeito.