o celular tocou, número não identificado. atendi. nada do outro lado da linha. em seguida, o fixo. mesma coisa. silêncio.
apesar de ter atrapalhado momento em que Lívia e eu estávamos a ouvir música, achei graça, ai mãe, tem alguém que quer ouvir sua voz.
há muito que um trote não rolava por aqui.
nos últimos tempos recebi coisas sem graça, como gente querendo se meter no meu e-mail, conta no facebook e até a criação de um perfil com meu nome (se bem que isso, se não me apavorasse por alguém inventar de falar bobagens por mim, me divertiria).
um trote telefônico é coisa de outros tempos, me empurra para uma época em que tudo era dourado e com certo pudor nas demonstrações.
me lembro menina, o telefone disparava a sirene da taquicardia, corria aflita, tempestade a derrubar cadeiras, almofadas e sapatos do caminho, chegava ao aparelho com o coração na boca. silêncio. uma respiração mansa e inocente, só para provar que do outro lado havia vida. e intenções. eu desconfiava saber do tímido remetente. e dia após dia a cena se repetia. depois, sem aviso prévio, se instalava a mudez do amor. nenhum sinal, nada de revelação. acabava sem confirmações e as ligações voltavam a um oco no espaço, sem nenhum tipo de consideração.
os tempos eram outros.
hoje, pelo inusitado, tive ímpetos de chalaça, mas na terceira vez confesso que ri atordoada pelo ridículo da situação. nesse sábado à noite em que eu e Lívia apenas queríamos continuar ouvindo musiquinhas que fazem bem ao espírito, sofrer paralisação por quem não tem voz para acompanhar, não combina.
muito melhor a ligação direta de Menescal e Bôscoli.