numa manhã amarela, mais amarela do que qualquer outra, saí de casa.
mas antes disso, acordei cansada, tão cansada como qualquer outra mulher, tomei banho e vesti uma roupa serena e nova.
mas antes disso, me olhei longamente no espelho. vi as rugas e o cabelo.
mas antes disso, percebi o olhar, que era o mesmo e já não era. como se o olho direito dissesse sim e o outro, o contrário. como se fosse nova e velha. como se eu e outra.
saí de casa.
mas antes disso, tomei café. e comi pão. e bebi suco. e voltei a encher a xícara como sempre fiz.
peguei a bolsa, tranquei a porta e desci todos os degraus, contando cada um dos 66 que me levava à rua.
mas antes disso, retoquei o batom, coloquei um cinto, as meias, os sapatos.
quando cheguei na calçada estava infeliz por ter que sair de casa. a vontade era só a de continuar sem ter vontade. mesmo assim andei.
passos firmes, largos.
mas antes disso, enquanto arrumava algumas coisas, como óculos, caderneta, caneta e carteira, dentro bolsa olhei com muita demora para o meu documento. data de nascimento, fotografia, assinatura, números. nenhum reconhecimento, nada era identidade.
andei em direção ao trabalho.
mas antes disso, contestei tudo.
depois também.