atravessei 2018 como quem passa por uma ponte muito longa sem perceber porque não olhou para a construção, mas ficou fixada no que corria por baixo ou no horizonte ou nos pássaros que voavam em volta.
fiquei presa à paisagem. fato que não merece nenhum tipo de juízo.
coisas grandiosas aconteceram comigo durante este ano.
apesar de terem sido tão imponentes não quer dizer que todas foram boas. de qualquer forma, prefiro me concentrar no que de melhor me aconteceu e deixar as amarguras para aquelas madrugadas assustadoras que não se transformam logo de uma vez em manhãs tranquilas. é durante esses momentos que fico mascando cada aflição, sentindo o azedume, deixando que passe pelos dentes, para depois engolir e sorrir sem sentido.
perdi pessoas importantíssimas nesse ano. e para isso não há remédio nem manhã ensolarada. é coisa séria largar a mão. nesse recorde de três relevantes para mim que estão por aí ao alcance de um telefonema, mas mais impossível que o cachorro alcançar rabo, entendi que uma delas nunca esteve de verdade comigo – e isso, por si só também é uma grande perda.
neste ano que começa a empalidecer para se transformar num desses lugares que nunca jamais retornarei, aprendi um novo trabalho; confessei pecados e os cometi novamente; ouvi o disco da Suzie; mudei de casa; votei e senti a derrota; escrevi; participei de coisas literárias; fui traduzida; comandei, próprio punho, uma reforma; conheci pessoas bacanas; inaugurei um plano de escrita; cumpri cronogramas; furei cronogramas; viajei; voltei; e viajei de novo e mais uma vez voltei; rompi definitivamente com Curitiba, para depois retornar submissa; escrevi poesias em número tão grande que poderia ter livro, não fosse a qualidade; vi, feliz da vida, uma das duas fitinhas do Nosso Senhor do Bonfim que estão amarradas no meu pulso desde 2015, a cair no momento do desejo realizado e isso foi muito interessante; fiz tatuagens; editei livro; recebi os amigos; torci pelo Brasil na Copa; engordei; reatei com minha mãe, mesmo sem ela saber que um mundo nos separava; senti saudade; me tranquei em casa.
apesar de tudo isso e muito que não foi citado, repito pensamento do passado. tenho muito a agradecer aos dias análogos. àqueles que não são destaques no calendário e nem foram dignos de anotações nos diários; os que para sempre ficarão no passado, sem sombra ou memória. esquecidos, injustamente entulhados no campo das inutilidades.
são eles, no entanto, que permitiram que tudo acontecesse, deram o respiro, o fôlego para as jornadas mais atribuladas. permitiram que eu repousasse quietinha em suas poucas variações para poder continuar a viver minhas demências.
talvez eles tenham sido uns 65 gatos pingados para 300 tigres loucos, mas me tiveram muita serventia.
noves fora, brindo, com gratidão, aos dias mornos.