não gosto de quem não sabe conversar.
faz tempo que eu sei disso.
faço concessões porque é preciso renunciar às próprias preferências para garantir o convívio, a sociabilidade, a urbanidade. preciso matar um pouquinho do que é essencial para mim por causa do outro, da outra.
isso é bem injusto.
e sofrido.
e revoltante.
e necessário.
poucas coisas no mundo, no meu mundo, são tão prazerosas quanto conversar.
um dos melhores cenários que posso imaginar é um dia de sol, no final da primavera, quase verão; um pouco antes do meio-dia; uma sangria de vinho branco, porque ainda é aperitivo; uma piscina, porque ainda não está quente sufi para a praia; uns petiscos, porque sempre cai bem; uma música baixinha de fundo, porque isso compõe o ambiente; uns passarinhos, porque eles são melhores que a música; três ou quatro amigas e/ou amigos, porque é um número bom; um papo espontâneo e sem compromisso porque é assim que é, que tem que ser.
é dentro desta cena que mora, para mim, uma felicidade pacata, serena e bonita. mas ela, a cena, pode ser alterada livremente, desde que mantido o ponto de fundamento, a conversa entre amigos.
para compreender esta minha imprescindibilidade, em vez de fazer um caminho pelas sensibilidades psicológicas, fui buscar a explicação no finado latim.
conversar é a filhinha de conversare, que significava conviver com alguém.
mas conversare não era nada antes de sua raiz, verso. e mesmo que eu tenha todas as tentações de definir verso, o verso primeiro em latim significava voltar, virar ou direcionar para algum lado. o prefixo com, por sua vez, derivou de cum, que era junto ou na companhia de alguém.
logo, explica o Dicionário Etimológico, “conversare era estar na companhia de outra pessoa, ter intimidade ou desfrutar de convívio regular com alguém. conversare também era morar ou passar bastante tempo em algum lugar”.
era um conceito que tinha relação com a proximidade, com a confiança, com a privança.
é esta partilha de experiências, calma, íntima e honesta, que tanto me seduz.
não gosto de falar, gosto de conversar.
e este prazer é quase insuperável.
mais uma vez, uma vez mais, é o texto o grande decodificador da minha vida, da minha vida inteirinha.
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