é madrugada e estou na emergência de um hospital.
longos corredores,
faixa pintada no chão
e silêncio de uma ala inabitada
me fazem pensar em coisas.
às vezes penso em algumas cores também.
mas o que me ocupa mesmo são as coisas.
embora sejam concretas,
chegam de uma forma muito divagante
se penso numa cadeira, por exemplo,
ela flutua, abstrata e um pouco azulada no ar.
agora pouco pensei em pneu de carro
rodava, rodava livre no espaço aberto
sem céu ou terra
numa velocidade de silêncio.
mesa de três pés,
copo vazio de vidro fino
balde com alça de metal,
tudo sem cenário e sem explicação.
de vez em quando ouço uma voz
e ela é mansa, aveludada, grave
uma voz que é só adjetivos,
porque assim são todas as vozes,
mas ela não diz nada
se sufoca no sussurro e finda em silêncio.
o hospital às três da manhã é um lugar quieto
um abafado de histórias
homens de branco que não têm passado
não contam suas vidas
não dividem a existência.
é madrugada e estou na emergência de um hospital.