Meu pai tem muitos silêncios, muitos olhares, muitos entendimentos. Olha pra vida e considera as perspectivas diferentes que ela tem.
É de educação pré-guerra, a de 1914, quando os homens sabiam que a gentileza, a calmaria, o ouvir e não perguntar são grandes bens para o bom convívio.
Ele é incapaz de indiscrição, sempre achou que não tem que especular a vida de ninguém, como também não tem que falar dos alheios. Elogios, só para os que realmente admira, mas não é chegado a adjetivos, prefere contar uma história para falar da contemplação.
Meu pai é homem persistente, as pedras que pipocaram em seu caminho acabaram usadas na construção de monumentos. E nesse trabalho descobriu-se algumas vezes e se reinventou para seguir de cabeça erguida, sem dever, mas doando.
Ele é tipo sério, perfil de esfinge, poucas palavras no primeiro encontro. Mas ri e gargalha e brinca e conta piadas.
É meio desajeitado com as demonstrações de afeto. Não diz estou com saudade, quero te ver, pensei em você. Em vez disso, compra bolo e aparece, telefona e fala sobre uma notícia do jornal, manda mensagem com pergunta qualquer sobre coisa que não sei. É o seu jeito de dizer.
Meu pai gosta de fazer pequenos consertos aqui em casa, até sobre assuntos que desconhece. Se chamo especialista, ele se aborrece, porque na sua cabeça pai, não há nada que ele não possa fazer por mim.
Gosta de escrever cartas e nelas trata de todas as palavras de amor que sua boca não diz e seus olhos revelam. Coleciono bilhetinhos desde o nosso começo.
Quando eu era criança, me dava jóias de presente e se maravilhava com meu encantamento; agora, me traz brinquedos e se diverte com minha farra.
É um andarilho, cruza a cidade a pé. Não acha que está ficando velho e não tem muitos medos. Atrás daquele bigode imponente, bate coração de manteiga que se emociona com os netos e sempre repete a mesma frase quando vai embora: “apareça!, ah! aqui é sua casa, eu apareço”.