neurastênica

A literatura, como toda a arte, é uma confissão de que a vida não basta.
(Fernando Pessoa)
 

tenho escrito muito nos últimos dias. páginas e páginas de conteúdo impublicável. 

sei que jamais contarei sobre o tema, mas me debruço com concentração de monge e escrevo.


gosto de escrever porque gosto de me comunicar; de pensar e falar sobre. e a única maneira que tenho de falar sobre o que penso é pela escrita. 
 
acordei com o nariz colado ao texto. dormi escrevendo, despertei escrevendo. 
e esse texto infinito continua na minha cabeça, não importa o que eu faça, com quem eu fale, o que descubra ou o que me ocupe, o fato é que tudo me leva a essa temática que certamente não virá a público, mas que me toma com força e poder de tempestade. 
já que não publicarei, obviamente falo sozinha. escrevo, escrevo, escrevo pra ninguém. 
 
e por que escrevo se sei que são palavras íntimas que permanecerão aqui caladas em minha escrita-leitura? foi nessa pergunta que descobri o sentido primeiro de tanta coisa no papel.
escrevo para me comunicar. esse é o segundo motivo; importantíssimo, vital, mas é o segundo. sou exibida e gosto de contar pro mundo o que eu penso; tenho vaidades, gosto de achar que o mundo se interessa pelo que penso. e assim vou, desse jeito cheio de informalidades, como sou, me comunicando e contando de minhas reflexões. que sentido bonito para meu destino! mas isso está em segundo lugar. não é menos importante, mas vem depois. 
 
antes de tudo, antes de qualquer raio, escrevo para me entender, para organizar, para traduzir o que se empilha na minha cabeça. 
é um jeito de não enlouquecer. 
escrevo porque minha cabeça tem que se adequar a uma sequência lógica para caber no papel da prosa e assim não tenho apenas sensações, mas tenho palavras para expressá-las e nas palavras o que é impressão do corpo vira fato inteligível.
é um exercício infinito de tradução. não bastasse ter que sentir, é preciso entender para escrever e escrever decentemente para ser entendida (não pelo outro, por mim mesma). 
 
ciclo de tormento e alegria.
 
por isso continuo com minhas linhas impublicáveis, íntimas, minhas. pensando em cada construção, procurando palavras certas, cuidando dos tempos dos verbos, economizando nos adjetivos, apagando e refazendo até que se torne a tradução exata para o que me toma os sentidos. 
continuo porque preciso saber de mim. é, de fato, um jeito de não enlouquecer. é o reconhecimento de que a vida não basta.
 
 

quer comentar? não se acanhe.

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