ecologia

Faz dez anos.

Estava a caminho de casa, com seis pães quentinhos dentro do pacote e vi, no canto da rua, móvel que parecia um fundo de armário, peça de algum closet antigo. Tinha umas inscrições pichadas e marcas de óleo, tinta, sujeiras mil.
Bati palmas e saiu o dono da casa. Perguntei. Ele me contou que era uma peça antiga, orginalmente feita para um dos quartos, quando veio a reforma, virou armário na garagem para guardar ferramentas e todo tipo de tranqueira que não cabia em nenhum outro lugar. Me interessei. Ele me disse que estava na rua justamente para ser levada.
Eu tinha seis pães quentinhos e pouca força para carregar o móvel. Pedi que o recolhesse de volta, com a promessa de buscá-lo no dia seguinte. O senhor me explicou sobre o inconveniente porque a reforma estava prestes a acabar e não podia entulhar os espaços com aquilo que, para ele, já era lixo. Insisti. Cedeu.
Na noite de planos buscando o melhor lugar para a nova moradora da casa, cheguei à conclusão de que ela precisaria de uma melhorada para compor bem o ambiente.
Manhã seguinte, corri para a loja de tintas e pensei em várias opções. Escolhi um verde, com a ajuda da Chica, a cor verde mais verde que existe.
Com a latinha debaixo do braço, conversei novamente com o homem. Precisava pintar o móvel. Sabe-se lá com quais argumentos, o convenci a fazer o trabalho e depois a entrega e instalação. Ele estava contrariado, mas concordou.
O móvel ficou tão verde e tão lindo que ele já queria desistir do negócio e recolocá-lo em seu antigo lar. Resisti. A palavra ali tinha que ter peso. Ele prometeu e tinha que cumprir até o final. Assim foi feito.
Na minha sala, virou estante. Acomodou, com elegância e graça, CDs, livros e toda sorte de quinquilharias que arrasto ao longo dos anos.
Mudei de casa, levei-a comigo.
Mudei novamente e já era hora de nova pintura. O Anderson, a quem foi entregue a tarefa, escolheu um verde ainda mais verde. Bandeira. E aumentou o número de prateleiras possibilitando que mais moradores se instalassem em seus contornos.
Não sei se foi o monta-desmonta, a idade avançada, as aventuras de tantos anos, as novas prateleiras ou o peso excessivo. Mas a verdinha criou barriga, envelheceu, se enverga com a idade. E agora chegou a hora de aposentá-la.   
Queria dar-lhe destino justo depois de tanto tempo aguentando todas as barras dessa e de outras casas. Não tenho coragem de oferecê-la a alguém, porque os esforços dos anos a deixaram cansada e não me parece coisa certa ofertar peça assim. Mas ela está aqui, órfã, verde, madura, a procura de novo lar.
 

Alguém?
 
 

quer comentar? não se acanhe.

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