um medo e uma vontade de morrer

trancada em casa, olhando o tempo passar pela janela e completamente entregue às desgraças das manchetes, há momentos que eu não consigo parar de chorar. 

tento normalizar a rotina, reconhecendo os privilégios de armário abastecido, biblioteca farta, possibilidades de filmes, músicas, o banho quente e todo o conforto que tenho na clausura. ler, escrever, deixar que o tempo corra… mas eu não consigo parar de chorar. 

as mortes do mundo me sufocam. penso nesses números e eles se dissolvem, um a um, nos relatos de pais, mães, filhas, avós. os números se transformam em gentes, em histórias particulares que não aceitam se empilhar em estatísticas.

nas páginas dos jornais, os comboios de caixões em marcha para incineração, a tentativa de ponto final em dramas que não terminam. vou a velórios imaginários, me despeço e não consigo parar de chorar. 

o futuro enfim se mostra como sempre foi: essa coisa que não existe, que caminha sem controle, que corre indomável. 

não ter vaga ideia de como ficaremos, do que ainda nos acontecerá, no coletivo e no individual; pensar nas minhas pequenas tragédias, imaginar os sofrimentos da minha mãe, a solidão do meu pai, me provocam, ao mesmo tempo, medo e vontade de morrer. 

não parece certo escrever agora. ainda assim escrevo, porque procuro, no fundo desse buraco que se abriu aqui, alguma razão.

quer comentar? não se acanhe.

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