um pequenino grão de areia

Tenho pressa, mas quero que a vida passe devagar.
Não entro sem ser convidada e preciso de, pelo menos, cem insistências diferentes.
Entrego, fortuna preciosa, o amor aos amigos, mas exijo permanente devolução.
Leio o mesmo livro várias vezes e deixo muitos pela metade. Tenho pessoas inteiras na vida e outras vão ficando aos pedaços.
Comecei a ver novela, gosto de ir ao futebol, não me interesso por festas, sempre escuto música e leio poesia em voz alta.
No supermercado procuro o que tenho vontade na hora, em casa preciso ir ao supermercado.
Estou cercada de gente boa e, como todo mundo, caminho sozinha.
Contradição é o meu nome: manhã, tarde e noite, 786 emoções diferentes. Tenho o que cada momento me dá e sinto o que ganho.
Já entendi que a vida passa num estalar de dedos e isso me revolta.
Não gosto de ficar velha, flácida, feia, grisalha, mas me orgulho dos anos vividos, das emoções sentidas, do caminho percorrido. Talvez fizesse tudo de novo, talvez até com as mesmas pessoas.
Quero todos os dias passear pela praia antes que seja tarde. Temo pelos descuidos do entardecer.
Sou frágil feito flor em dia de tempestade: agarrada ao caule resisto.  
Não vivo mais sem celular e internet, mas vez ou outra faço questão de esquecê-los. Gosto quando o telefone toca na bolsa e eu ouço sem saber e sem atender: a sensação de domínio e libertação!
Não me fissuro em pretensões de riqueza, mas minhas vontades custam a grana que não tenho, que nunca terei. Conheço a frustração do sonho não realizado.
Jactância de transformar o mundo, arrogância de mudar pessoas, bazófia de criticar. No íntimo, me recolho e sei do meu tamanho: pequenino grão de areia, corisco no caos.
Creio em Pixinguinha, em Van Gogh, em García Márquez, em Fernando Pessoa porque acredito na beleza como profilaxia.
No mais, tenho pensamentos secretos e sonhos que encheriam um caminhão.
 
 


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