silêncio

escrevo pelos cotovelos. todos os dias. o tempo todo. até quando não estou a escrever, estou a escrever. meu pensamento é moldado para a escrita. uma narrativa eterna que fica rondando minha cabeça, a computar as coisas, as situações, as pessoas.

as vezes é bom. as vezes é enlouquecedor. as vezes não é nada.

o que fica registrado neste jardim azul e branco é uma parte, que embora me desnude e me lance sem pudor no mundo, não é tudo. pétalas de dente de leão ao vento.

tenho freios.

a linha da censura é a relação direta com o que me imobiliza, o que não se torna palavra publicável ou entendível. o que não tem forma, nem encontra nessa disposição a compreensão necessária para os sentimentos.

as vezes isso tudo escorre para diários. meus. secretos, que guardo por anos e depois jogo fora, imensa fogueira, ou os transformo, os reciclo e eles viram papeis de carta em que escrevo notícias, próprio punho, que merecem e precisam deste formato. noutras, faço desenhos mal arrumados que riscam a folha com fúria ou melancolia e ali desabam todo o peso dos meus ombros. ou todo o sacrifício de viver. e sempre, toda a incapacidade de expressão.

é o que não está para o crível que guardo, que guardo e entupo os poros, que guardo e estanco as veias, que guardo e não digo. meu avesso é feito de escadas, degraus que nem sobem nem descem, que não indicam direção nem conhecem saída. Escher sem talento. um transbordar que não sai do copo, do corpo.

quem dera fosse isso silêncio. plácido silêncio do não existir. mas há barulho e lágrimas e olhares. há o retrocesso da existência, a enormidade do inteligível.

assim, no meio dessa gritaria, é que me calo, é o lugar onde as palavras não existem e um só desespero reina.
e para ele, ainda não existe nome, nem escape.

 

quer comentar? não se acanhe.

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