alguma coisa acontece no reino de Manguinhos

o lugar rodeia a realidade, dança em sua órbita, pisca-lhe os olhos, mas não se rende. fica sempre a dois passos do verídico, da ordem que aprendemos como crível. tudo tem cor de fantasia, mas se exibe, tátil, diante dos olhos.

acho graça.

dessa vez, um encontro. a Sylvia me contou.

não entendo de pássaros, mas estou habituada a vê-los por aí, em pares ou em grupos, na tolerância da mesma espécie. algumas famílias até se respeitam, mas não se misturam. cada macaco no seu galho e pronto.

o caso se deu a partir do encontro de um Calafate e um Melro. o primeiro parece que é bicho de gaiola, o outro de liberdade.

a liberdade é coisa que precisa ser aprendida. não conquistada, mas intuída dia a dia na sinfonia da experiência. é um mistério cheio de armadilhas e perigos. é também uma ilusão. só os mais fortes de espírito lhe são capazes.

e esse Melro, tão livre quanto seu voo, é a expressão mais simples e definitiva de autonomia. se exibe a fazer pirotecnias em asas ou piados? briga e protege seus espaços? regula comida ou dá broncas? não. o pássaro, dono da liberdade desde que nasceu, sabe que não tem nada, que não ter nada é ser livre. mais, ele conhece a sobriedade, não precisa fazer alarde do que é, do que tem.

ser livre é ser mais. e ser mais é, também, abaixar a cabeça e deixar que o próximo te observe, te aprenda, te saiba. sem medo nem disputa. na autonomia está também a modéstia, a verdadeira e decente modéstia.

e o Calafate? observa tranquilo, olhos de aprender. tem, diante de si, nessa terra de fantasias que é Manguinhos, um mestre da mais alta dignidade. segue em silêncio, cada movimento do outro é um aprendizado que coloca dentro de sua mala. quando a bagagem estiver completa, a deixará e voará livre, porque quem é livre não precisa dos pesos.

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o achado, a observação, as fotos são da Sylvia Abaurre.

Uma resposta

  1. Maria bernadete de lima

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