recebi fotos de viagem. diversas. minha irmã parece que sabe a hora exata para fazer as coisas. quando meu olhar estava mais para a próxima viagem que para a anterior, mais ao longe do que o que ainda está tão pertinho, ela me manda correspondência imensa com nossa memória de Salvador. curioso reparar em algumas coisas. a comunhão com o mar realmente me faz outra. …
aguardo o passar dos danos a pedra furada pela água mole e o perdão de cem anos. mesmo com paciência como cru porque é cor de rosa a grama do vizinho não espero e já alcanço e rio melhor: início, meio e fim. dou a César dois pássaros na mão e ele me confessa que não beberá dessa água. sigo nos trilhos e estou na …
eu tenho uma vida inteira desperdiçada em lágrimas toda mi vida a llorar, caer en lluva de sal escorreu em meu rosto, traços fundos, todo tipo de lástima sufrí pelos hombres que no lo saben gritei as verdades num coro total naufragué en los córregos menos profundos e por fim larguei as esperanças no canto dos boicotes poco a la izquierda para otros tiempos mesmo …
a poesia está em mim como a música. sou uma amante submissa, que admira, se encanta, entende, alcança. e só. e já é muito. vez ou outra cometo a saliência vulgar de tentar o que não sou. a poesia é generosa e me deixa passear inocente entre seus versos, abre sua casa e me chama para que eu entre, para que eu visite, para que …
no silêncio daquelas sementes que boiaram no ar do quintal da casa da minha vó numa tarde de outono, pensei que o dente de leão que eu soprava era o que de mais enigmático existia no mundo. não por conta dos traços botânicos, mas por aquela maneira tão grandiosa de a partir de um sopro se transformar em muitos pedaços e cada um ser dono …
estranho, estranhíssimo. o Facebook me avisa que há dois anos eu passava as primeiras horas do dia 10 de agosto a procurar a empatia do Álvaro de Campos para apoiar o desespero da madrugada insone. aqui estou, condição bem parecida – troquei Álvaro por leitura menos interessante na providência de me aborrecer e entediar (e então dormir) do que me explicar… porque num determinado momento, …
pode ser que essa vontade de comer pastel na feira passe, como talvez passe também o desejo de caminhar na praia, de entrar no mar, de contar estrelas e de aprender a costurar. vai que eu mude de ideia e não precise mais pisar na Estação de Sirkeci ou não queira as alvoradas dos canarinhos muito amarelos da minha varanda. quem sabe, eu desista assim, …
uma de minhas obrigações diárias é levar o cão para passear na pracinha. gosto do cão, de praça e de passeio, a palavra obrigação é que me lança numa profunda preguiça e má vontade. mas é também o que mantém a rotina e a certeza de surpresas num dia qualquer de uma semana assim perdida no calendário. para melhorar a vida, há algum tempo montei …
sou uma pessoa sensível. há maravilhas nesse traço. possibilidades que se multiplicam todos os dias ao ver uma flor, um sorriso, uma poesia. até um poste, que não é nada a outros olhos, se transforma numa fonte de especulação, reflexão e comoção. gosto disso porque minha vida fica mais rica. eu acho. é uma coisa bonita minha, autoelogio. conheço as delícias. as dores também. nem …
se eu fosse uma celebridade dessas que desperta interesse nas pessoas, escreveria um livro. seria sobre pessoas que ninguém deveria partir dessa para outra sem conhecer. minha lista transformaria a agenda dos meus amigos num inferno. nomearia um por um com detalhes pitorescos de suas personalidades, preferências, particularidades, fotografia e telefone. falaria de como cada um tocou minha vida e de suas possibilidades de espírito. …